Da falibilidade das maiorias
Obra inquietante de um autor caluniado, O Príncipe, de Maquiavel – a primeira obra de ciência política pura e assumida – advoga a necessidade do governante dominar o seu povo da mesma forma que o homem domina a natureza. As condições deste domínio são, todavia, enviesadas e esquivas, pelo que a disposição do povo se torna por vezes tão dúbia quanto o estado meteorológico. Hoje, quando as urbanizações se substituem ao ambiente menos urbano do pensador florentino, torna-se ainda mais visível a forma dúbia com que o povo, desgovernado e bruto, se debate massivamente com a rude natureza que não domina. Veja-se o exemplo e atente-se na parábola.
A Rua 31 de Janeiro, em pleno coração da Invicta, é um autêntico palco para o formigueiro humano, oferecendo uma perspectiva paisagística sobre o modo como o Homo Sapiens se move e locomove. Apreciemos então a rua, cheia de enfileirada gente. Imaginemos esse cenário sob chuva indecisa e tempo cinzento, de tal modo que, a espaços, um intermitente aguaceiro espirre sobre a multidão cabisbaixa. O grande problema do transeunte está em saber quando a chuva é real ou apenas psicológica, ou seja, quando começa a ser realmente válida a utilização do guarda-chuva ou, ao contrário, quando ele é apenas a face mais visível de um tipo de histeria colectiva viciada em secura e varas de alumínio. A resposta é simples, evidente, mas transporta uma conotação política verdadeiramente alarmante para as modas referendárias e ditaduras da maioria.
Assim, se numa rua populosa a maioria dos cidadãos transportar o guarda-chuva aberto e um deles (um único) o transportar fechado, o mais provável é que já não esteja a chover, dando razão a um e fazendo com que todos os outros incorram em erro. Ao contrário, quando as pingas já inundam a cabeça de uma forma tão evidente que invalide todas as benfazejas impressões de que tal encharcamento provenha de uma teimosa goteira no sopé de um telhado, é preciso que um dos cidadãos (um único) tenha a iniciativa de abrir o guarda-chuva para que todos os outros lhe imitem o ajuizado gesto.
Por vezes, as evidências pesam-nos sobre os ombros como as palavras para Victor de Matos e Sá: como inexplicáveis dias de chuva. Daí que em países solarengos, espectadores mais atentos da falibilidade das zonas de maior pluviosidade, os governos das maiorias fracassem de modo mais sistemático. E é por isso também, para manter a crença na boa índole das democracias, que me recuso terminantemente a usar guarda-chuva.
A Rua 31 de Janeiro, em pleno coração da Invicta, é um autêntico palco para o formigueiro humano, oferecendo uma perspectiva paisagística sobre o modo como o Homo Sapiens se move e locomove. Apreciemos então a rua, cheia de enfileirada gente. Imaginemos esse cenário sob chuva indecisa e tempo cinzento, de tal modo que, a espaços, um intermitente aguaceiro espirre sobre a multidão cabisbaixa. O grande problema do transeunte está em saber quando a chuva é real ou apenas psicológica, ou seja, quando começa a ser realmente válida a utilização do guarda-chuva ou, ao contrário, quando ele é apenas a face mais visível de um tipo de histeria colectiva viciada em secura e varas de alumínio. A resposta é simples, evidente, mas transporta uma conotação política verdadeiramente alarmante para as modas referendárias e ditaduras da maioria.
Assim, se numa rua populosa a maioria dos cidadãos transportar o guarda-chuva aberto e um deles (um único) o transportar fechado, o mais provável é que já não esteja a chover, dando razão a um e fazendo com que todos os outros incorram em erro. Ao contrário, quando as pingas já inundam a cabeça de uma forma tão evidente que invalide todas as benfazejas impressões de que tal encharcamento provenha de uma teimosa goteira no sopé de um telhado, é preciso que um dos cidadãos (um único) tenha a iniciativa de abrir o guarda-chuva para que todos os outros lhe imitem o ajuizado gesto.
Por vezes, as evidências pesam-nos sobre os ombros como as palavras para Victor de Matos e Sá: como inexplicáveis dias de chuva. Daí que em países solarengos, espectadores mais atentos da falibilidade das zonas de maior pluviosidade, os governos das maiorias fracassem de modo mais sistemático. E é por isso também, para manter a crença na boa índole das democracias, que me recuso terminantemente a usar guarda-chuva.