Bloqueios literários I

Disse certa vez um intelectual barbudo e personagem blogosférica, a quem por conveniência designo apenas por PP, que lhe dava particular prazer não ler “livros da moda”, desses que toda a gente lê. Levo esta máxima ao exagero, movido pelo prazer altivo de, quando todos citam e recitam, em tertúlia entusiástica, a obra em questão, excluir-me da conversa com um breve e evasivo “Não li!”. Tal fenómeno de moda agrava-se quando, em círculo vicioso, os livros devêm filmes e estes, por sua vez, eternizam o fenómeno de moda dos livros que os geraram.
Assim se passa com o citadíssimo Perfume, bloqueio literário que hoje decido revelar. É sabido que os livros são realidades sensitivas, que exigem o máximo primor das faculdades biológicas e humanas; talvez por isso, de cada vez que me tento pelo Perfume dou por mim constipado. De cada vez que abro a primeira página, antes mesmo da primeira linha, tapa-se o nariz e, com ele, toda a possibilidade de bem sucedida fruição do Perfume… Ora isto sim, é um bloqueio, um duplo bloqueio (literário-gripal) de sintomatologia agravada pelo nome do autor: Süskind… (Santinho!)
Se damos razão a Gide, quando disse que bons sentimentos nunca fazem boa literatura, uma obra intitulada Perfume nunca pode ser famosa – melhor seria uma narrativa hipotética chamada Fedor! Enquanto a não houver, declaro, para escândalo de cafés, esplanadas e salões, o meu nariz literário virgem de tão oloroso perfume, dizendo com orgulhosa ignorância que não sei do que estão a falar. Isto também por incapacidade física: Numa reacção alérgica, o meu nariz fica entupido, as fossas nasais obstruídas e um afrontamento de febre invade-me de cada vez que Süskind (Santinho!) se eleva da bibliografia dita “obrigatória”. Não, não li o Perfume… e Süskind (Santinho!) nem cheirá-lo! Estive para ver o filme, não fosse o súbito ataque de conjuntivite que sofri à porta do cinema…
É a vida!